Não importa que idade você tenha ou que momento da vida esteja passando –
uma hora dessas você vai se defrontar com a questão da segunda chance. Talvez
seja um amigo perguntando se vale a pena tentar de novo com aquela garota que
tanto mal fez a ele. Ou você mesmo terá de decidir se um velho amor que
reapareceu merece ou não ser revivido. De uma forma ou de outra, essa pergunta
sempre se coloca.
Da minha parte, tenho a responder que não acredito mais em segunda chance.
Já fui um crente fervoroso na volta do amor perdido – durante um tempo, essa
crença foi o São Sebastião da minha vida – mas hoje vejo essa esperança como
quimera e fantasia. Uma ilusão paralisante. Na melhor das hipóteses, acho a
ressurreição da paixão é uma possibilidade remota.
O grande amor, o amor médio, o amorzinho: nenhum deles tende a dar certo na
segunda temporada. Por mais que haja más intenções e bons sentimentos (a
combinação mais gostosa do mundo), ou ainda que os parceiros nadem em aspirações
sublimes, coisas repetidas têm vocação para dar errado. São como um vaso que uma
vez quebrado nunca mais será o mesmo.
Comigo, o insucesso aconteceu com mulheres que, até hoje, me comovem só de
vê-las passar na rua, só de olhar o avatar no Twitter. Não foi por falta de
afeto, portanto, que as retomadas não deram certo. Em alguns casos, é verdade,
houve insuficiência de desejo, de parte a parte. Quando se trata de sexo, a
volta pode ser até melhor (as pessoas, afinal, aprendem), mas raramente deixa
uma impressão emocional tão duradoura. Novidade, a gente queira ou não, faz
diferença. E experiência não substitui envolvimento.
Tenho a sensação de que os amores requentados são como remendos. Elas não
resistem ao tempo nem ao atrito. O que na primeira vez era novo agora tem um
gosto de repetido. E há detritos que vão se acumulando a cada separação.
Rancores, mágoas, coisas não ditas. Com o tempo, esse entulho cerca a cama, se
espalha pelos corredores, invade a sala e a cozinha. A gente tropeça nele. Mesmo
sem querer, passamos a procurar, nos olhos e nos gestos do outro, os primeiros
sinais de esgotamento, que uma hora ou outra aparecem. Intuímos que é difícil
evitar que um rio avance pelo caminho que já foi aberto.
Entre os amigos, consigo me lembrar de um único caso – vá lá, dois – em que
a volta não foi apenas um desastre passageiro. O roteiro de quase todos os
reatamentos que eu presenciei, ou dos quais ouvi falar, é parecido: pessoa
carente ou perdida volta ao porto seguro de onde fora solenemente despachada ou
estivera louca para zarpar. E de onde, passado algum tempo, vai querer velejar
de novo, ou será expulsa novamente.
Essas tentativas tristes, que às vezes se repetem até o esgotamento, são na
verdade os casos benignos. Há exemplos de pessoas que retornam sistematicamente
para tipos mentirosos, agressivos ou quimicamente dependentes, com resultados
dramáticos.
Vistas de fora, as apostas no videotape
existencial parecem tíbias e frágeis, mas não é assim que as pessoas envolvidas
percebem. Elas acham que estão voltando ao curso natural do seu destino. Pensam
estar retomando o fio rompido da própria existência. Fazem força para acreditar
que aquela escolha, desta vez, as fará felizes. Sentem-se românticas, se dizem
românticas, mas, na verdade, estão sendo práticas. Depois de meia dúzia de
fiascos afetivos, voltam para a zona de conforto (ou de conflito) semifelizes,
com um rabo invisível espremido entre as pernas. Em geral descobrem,
rapidamente, que voltar é fácil. Permanecer são outros quinhentos.
Por que voltamos, afinal?
IVAN
MARTINS
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