É normal e esperado que pais, familiares e amigos íntimos
preocupem-se conosco e perguntem sobre nossas vidas. Nesses casos,
trata-se de afeto e consideração, pois quem nos ama nos dá atenção com
intenções sinceras. Porém, há quem pareça saber tudo sobre nossas vidas,
até mais do que nós mesmos sabemos, e pior, indivíduos que mal
conhecemos, pois não fazem parte de nosso caminhar.
Existem pessoas que têm mania de falar da vida alheia para quem
quiser ouvir e onde estiver. De longe, controlam a hora em que chegamos e
saímos, o que almoçamos e com quem, se repetimos ou não a roupa, se
trabalhamos direito, com quem estamos nos relacionando, enfim, são os
biógrafos de plantão. Temos a sensação de que estamos sendo observados
por câmeras escondidas, tamanha é a convicção com que essas pessoas
fazem afirmações sobre nossas vidas.
Se os biógrafos de vidas alheias se limitassem a nos pesquisar para
si só, seria menos irritante. Mas não, eles fazem questão de falar sobre
nós para os outros, na maioria das vezes denegrindo nossa imagem,
destacando em nós aquilo que eles julgam inadequado. Têm a necessidade
de apagar qualquer brilho que possa vir a ofuscar a sua suposta
superioridade, no trabalho e na vida lá fora, fazendo de tudo, de forma
perigosamente velada, para que chefes e colegas vejam em nós alguém não
confiável.
Tentar controlar a vida do outro é tão inútil quanto varrer as folhas
enquanto venta. As pessoas são o que são e não mudarão para
simplesmente atender aos caprichos de outrem. Mudamos nossos
comportamentos quando nos conscientizamos verdadeiramente de que estejam
nos prejudicando e somente se quisermos. Controlar o parceiro
excessivamente não vai impedi-lo de trair. Controlar o trabalho do
colega não o fará deixar de entrar atrasado ou de enrolar o dia todo.
Ninguém tem poder sobre a vida alheia, felizmente ou infelizmente que
seja. Ser pressionado e acuado muitas vezes nos incita à revolta e à
tentação de agirmos exatamente de forma contrária às expectativas do
outro. Nossa natureza é rebelde e reage negativamente ao controle
externo – a vida, libertadora em sua essência, odeia amarras de
quaisquer tipos.
Pessoas que se comprazem em querer saber tudo da vida do outro
parecem ser indivíduos vazios e infelizes, pois não conseguem achar nada
de bom em si mesmos, ou seja, não enxergam nada que valha a pena dentro
de si e necessitam se preencher com algo de fora. Tentar diminuir o
outro com maledicências, além de ser uma atitude covarde, denota
fraqueza emocional e de caráter. O vazio interior e o desprezo de si
mesmo devem ser tão insuportáveis, que passam então a ser combatidos com
a exposição venenosa da vida alheia. Quem é infeliz consigo mesmo não
suporta ver ninguém esboçando sorrisos e tenta atrair tudo à sua volta
para sua escuridão miserável – inutilmente, na maioria das vezes, pois
quem brilha por si só não se abala com miudezas como essas.
A preocupação dos pais com as andanças dos filhos, dos amigos com
nossa saúde física e emocional, do chefe com nossas tarefas, do
professor com nosso aprendizado são bem vindas e necessárias, pois
servem como motivação e ordenação de aspectos importantes de nossas
vidas. No entanto, sermos observados e comentados negativamente por
pessoas que não nos dizem respeito, que não se importam minimamente com o
nosso bem, é perturbador e desagradável. Podemos até tentar deixar
claro, aos enxeridos de plantão, que estamos incomodados e que procurem
algo mais proveitoso para si próprios com o que se ocupar, mas
dificilmente nos ouvirão, pois seu caráter é surdo.
Ignoremos simplesmente, pois não suportam desprezo de ninguém, além
de serem indignos de que percamos um segundo de nossas vidas com eles.
Lembremos que a verdade sempre aparece, a despeito de toda fofoca e toda
maldade que nos cerca, pois o bem, assim como na ficção, haverá de ser
mais poderoso do que o mal na trama de nossas vidas. Porque não somos
celebridades, então não somos obrigados.
Marcel Camargo
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